Negativa de cirurgia pelo plano de saúde: quando é ilegal e como contestar
- Lucas Simon

- 28 de mai.
- 7 min de leitura

A negativa de cobertura de cirurgia por parte dos planos de saúde é uma situação recorrente que gera insegurança e frustração nos pacientes. Entretanto, é fundamental compreender que essa recusa nem sempre é legítima. Neste artigo, vou te falar sobre os aspectos legais que envolvem a negativa de cirurgia pelos planos de saúde, destacando quando ela é considerada ilegal e os meios legais disponíveis para contestá-la.
O rol da ANS é taxativo ou exemplificativo? O que diz a lei sobre a negativa de cobertura de cirurgias pelos planos de saúde?
A Lei nº 9.656/1998, que regula os planos de saúde no Brasil, estabelece que os contratos devem garantir cobertura para procedimentos médicos, incluindo cirurgias, conforme o Rol de Procedimentos e Eventos em Saúde da ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar). Este rol define os procedimentos mínimos que os planos são obrigados a cobrir, mas é importante destacar que ele possui caráter meramente exemplificativo, conforme entendimento consolidado na jurisprudência.
Os planos (de acordo com a minha experiência) sempre negam sob a justificativa do rol "taxativo" ou, se não conseguem por esse meio, encontram outro entrave contratual. Isso porque não é todo mundo que pode ser assessorado por um advogado especialista contra planos de saúde - talvez compense mais responder a um número menor de processos a dar cobertura a todas as demandas dos beneficiários.
A saúde é um direito fundamental garantido pela Constituição Federal e uma obrigação do Estado. No entanto, o ordenamento jurídico também autoriza e regulamenta a atuação da iniciativa privada no setor, por meio da oferta de planos de saúde. Para garantir que essa atuação ocorra dentro de padrões mínimos de qualidade e respeito ao direito à saúde, o Estado criou a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), que estabelece regras para o funcionamento das operadoras.
Uma das principais atribuições da ANS é definir o Rol de Procedimentos e Eventos em Saúde, uma lista que estabelece as coberturas mínimas obrigatórias que os planos de saúde devem oferecer aos consumidores. Esse rol busca garantir que, no mínimo, certas doenças, condições de saúde, deficiências e tratamentos sejam cobertos pelas operadoras.
No entanto, durante anos, muitas operadoras limitaram suas coberturas apenas ao que constava nesse rol, recusando tratamentos mais modernos ou específicos, mesmo quando indicados por médicos. Essa prática foi amplamente questionada, por ferir tanto a autonomia do profissional de saúde quanto a função social do plano de saúde, que é justamente garantir o acesso pleno à saúde.
Após intensos debates jurídicos e sociais, foi sancionada a Lei nº 14.454/2022, que deixou claro que o rol da ANS tem caráter exemplificativo. Ou seja, os planos de saúde são obrigados a cobrir tratamentos fora do rol, desde que preenchidos alguns requisitos: recomendação médica fundamentada, comprovação científica de eficácia, e respaldo de órgãos técnicos nacionais ou internacionais.
Assim, reafirma-se o princípio de que a saúde do paciente está acima da lógica comercial das operadoras, e que o direito à vida e à saúde deve prevalecer sobre interpretações restritivas do rol da ANS.. Veja o texto da lei:
§ 12. O rol de procedimentos e eventos em saúde suplementar, atualizado pela ANS a cada nova incorporação, constitui a referência básica para os planos privados de assistência à saúde contratados a partir de 1º de janeiro de 1999 e para os contratos adaptados a esta Lei e fixa as diretrizes de atenção à saúde.§ 13. Em caso de tratamento ou procedimento prescrito por médico ou odontólogo assistente que não estejam previstos no rol referido no § 12 deste artigo, a cobertura deverá ser autorizada pela operadora de planos de assistência à saúde, desde que:I - exista comprovação da eficácia, à luz das ciências da saúde, baseada em evidências científicas e plano terapêutico; ouII - existam recomendações pela Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no Sistema Único de Saúde (Conitec), ou exista recomendação de, no mínimo, 1 (um) órgão de avaliação de tecnologias em saúde que tenha renome internacional, desde que sejam aprovadas também para seus nacionais.”Jurisprudência sobre negativa de cobertura para cirurgia
O Superior Tribunal de Justiça (STJ) tem se posicionado no sentido de que o rol da ANS é exemplificativo. Em decisões recentes, o STJ afirmou que:
O rol da ANS possui caráter exemplificativo, sendo abusiva a negativa de cobertura de procedimento considerado essencial para a saúde do paciente, mesmo que não conste na lista da ANS .
Esse entendimento reforça a ideia de que a ausência de um procedimento no rol da ANS não autoriza, por si só, a negativa de cobertura pelo plano de saúde.
Quando a negativa de cirurgia é considerada ilegal?
A negativa de cirurgia pelo plano de saúde é considerada ilegal nas seguintes situações:
Prescrição médica fundamentada: Quando o procedimento é indicado por médico habilitado, com base em evidências científicas e diretrizes clínicas reconhecidas.
Urgência ou emergência: Em casos de urgência ou emergência, a negativa é ilegal, mesmo que o paciente esteja em período de carência, conforme disposto na Lei nº 9.656/1998.
Cobertura contratual: Quando o procedimento está previsto no contrato do plano de saúde, independentemente de constar no rol da ANS.
Cláusulas abusivas: Quando o plano de saúde utiliza cláusulas contratuais que limitam indevidamente a cobertura, em desacordo com o Código de Defesa do Consumidor - ou quando se utilizam de meios legais para criar embaraços ou obstáculos intransponíveis, a exemplo da coparticipação que impede tratamento.
Exemplo prático:
A frase “É abusiva a negativa de cobertura de procedimento cirúrgico indicado por profissional habilitado, com base em cláusula contratual que limita a cobertura de tratamentos não previstos no rol da ANS” é uma tese jurisprudencial consolidada, frequentemente citada em decisões dos Tribunais de Justiça estaduais, STJ e TRFs, especialmente após o julgamento do Tema Repetitivo nº 1.082 do STJ.
Tema 1.082 do STJ:
O Superior Tribunal de Justiça (STJ), ao julgar o Tema 1.082 (REsp 1.886.929/SP e REsp 1.889.704/SP), fixou a seguinte tese:
"O rol de procedimentos e eventos em saúde suplementar é, em regra, taxativo." Mas, “é possível a cobertura de procedimento não incluído no rol da ANS, em caráter excepcional”, desde que: (i) inexista substituto terapêutico; (ii) haja comprovação de eficácia do tratamento; (iii) seja recomendado pela CONITEC ou por órgãos equivalentes internacionais; (iv) haja prescrição médica fundamentada.⚠️: Após esse julgamento, houve reação legislativa, e foi publicada a Lei nº 14.454/2022, que alterou a Lei dos Planos de Saúde (Lei nº 9.656/98) para afirmar que o rol é exemplificativo,
Como contestar a negativa de cirurgia pelo plano de saúde?
Existem diversas formas de contestar a negativa de cirurgia pelo plano de saúde:
1. Recurso administrativo - Notificação Extrajudicial
O primeiro passo é interpor um recurso administrativo junto à operadora do plano de saúde, solicitando a revisão da negativa. Eu, como advogado, parto de imediato para uma Notificação Extrajudicial, que servirá de prova para o processo judicial - a resposta dessa notificação, geralmente vem acompanhada de uma formal negativa ("recursos administrativos" interpostos pelo beneficiário, até hoje não vi resultado positivo, mas é uma opção).
2. Reclamação junto à ANS (funciona?)
Como profissional que atua diariamente nessa área, percebo que, na maioria das vezes em que o beneficiário recorre à Justiça diante de uma negativa do plano de saúde, trata-se de uma situação de urgência ou emergência.
A ANS estipula curto prazo para análise e resposta do caso, mas o cumprimento do prazo não significa que a operadora será obrigada a resolver a favor do consumidor. Ela deve responder justificadamente, mas a decisão final da ANS pode ou não ser favorável.
A ANS não substitui o Poder Judiciário. Se o consumidor busca uma liminar ou indenização por danos morais, a via judicial ainda é mais eficaz a curto e a longo prazo.
⚠️O acompanhamento técnico do advogado da saúde é essencial, pois é ele quem planeja com estratégia, visando o melhor resultado final, desde o primeiro contato com o cliente. Por isso, buscar auxílio de um advogado especialista, antes de qualquer tomada de decisão, é fundamental aos resultados que serão alcançados.
Melhor prevenir e investir na sua saúde desde já do que recorrer à Justiça quando já não houver mais o que ser feito.
3. Ação judicial contra o plano de saúde por negativa abusiva
Caso as medidas extrajudiciais não resultem em solução, o paciente pode ingressar com ação judicial, pleiteando a cobertura da cirurgia e, se for o caso, indenização por danos morais. O Poder Judiciário tem reconhecido, em diversas decisões, a abusividade da negativa de cobertura de procedimentos essenciais para a saúde do paciente.
O STJ tem consolidado o entendimento de que a negativa indevida de cobertura de procedimento médico configura dano moral. Em decisão recente, o STJ afirmou:
"A recusa indevida de cobertura de procedimento médico, especialmente quando envolve risco à saúde ou à vida do paciente, configura dano moral, sendo passível de reparação" .
Aqui está o maior perigo: "sendo passível de reparação", não significa que toda negativa, ainda que abusiva, será indenizada.
🚩Dica/aviso aos colegas advogados: apesar de se tratar (teoricamente) de dano moral "in re ipsa" e de haver decisões condenando as OPS, os Tribunais têm reconhecido o direito à indenização somente em casos que se possa efetivamente comprovar o dano. A mera quebra contratual não gera dano indenizável. Subi um recurso sobre esse assunto ao STJ, visando formar precedente - esperamos bons resultados desse esforço.
Como Garantir Seus Direitos em Caso de Negativa de Cobertura:
A negativa de cirurgia pelo plano de saúde, quando não fundamentada em razões legais e contratuais válidas, é considerada ilegal. Os pacientes têm o direito de contestar essa negativa por meio de recursos administrativos, reclamações junto à ANS, notificações extrajudiciais e ações judiciais. É fundamental que os beneficiários estejam cientes de seus direitos e busquem orientação jurídica especializada para assegurar a efetivação da cobertura de procedimentos médicos essenciais à sua saúde.
O acompanhamento (desde a primeira negativa) com advogado especializado é essencial para traçar uma rota assertiva e veloz para o resultado de uma liminar (que garante o tratamento imediato), assim como o final do processo com a sentença.
Se você ou alguém que você conhece está enfrentando a negativa de cobertura de cirurgia pelo plano de saúde, ou de outro tipo de tratamento (cirúrgico, terapêutico ou medicamentoso) é recomendável consultar um advogado especializado em Direito da Saúde para avaliar as medidas cabíveis e proteger seus direitos.
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